segunda-feira, 16 de fevereiro de 2009

As árvores da minha rua




as árvores da minha rua estão despidas. indefesas, vão resistindo ao inverno com a tenacidade e paciência dos sábios. de manhã podem aquecer-se e reconfortar-se. é que pelo nascer do dia o sol tem-se apresentado em grande estilo, revelando um óptima performance para a época.

no telhado do “health club” e a partir da janela estão marcados os pequenos regatos orvalhados, os resquícios da noite que acaba de se ausentar. o ciclo da renovação. a natureza tem o essencial todo escrito. o claro depois do escuro. o quente depois do frio. a calma após a intempérie.
mais adiante na auto-estrada inicia-se o tráfego massivo das 2ª feiras. o monsanto, onde ontem me libertei, ainda se consegue ver através de alguns prédios. a construção tem varrido todas as encostas. as vistas vão estreitando, as pessoas e as árvores vão ficando mais encarceradas. mas tal como as árvores só há uma solução: persistir, porque a nova estação chegará. mesmo que custe alguns ramos e a totalidade das folhas. renascerão.
as pessoas também vão ficando mais despidas. o rei vai nú. despidas de si próprias. é necessário voltar a olhar as árvores: já passaram por tudo e não se vergaram aos novos apóstolos da razão universal. vai havendo menos espaço para a diferença. as árvores despidas “parecem mal”, há quem não goste porque não ficam bonitas nas capas das revistas. e as pessoas também não querem mostrar-se despidas, têm receio – mais ainda, de se mostrarem despidas de si próprias. e a par do receio talvez tenham vergonha. o fosso vai aumentando. engrossam as fileiras dos resignados. na frente da batalha pela dignidade da “pessoa” há mais desertores e menos guerreiros. mas estes sabem que só têm uma missão na vida: continuar a luta. apesar de tudo. e é em cada árvore, em cada pessoa, que começa. a palavra passa.
porque quem sabe, ou tenta lutar por saber a vida, compreende:
- só vale a pena viver na linha da frente.
é aí que estão as vestes, para que cada um volte a vestir-se - de si próprio.
e é na transição do inverno para a primavera que surgem as maiores oportunidades para reassumir as diferenças. afinal, a riqueza que fortalece a natureza.
ab

1 comentário:

Anónimo disse...

Amigo
uma palavra apenas para este teu post: genial.
Abraço,
António