sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Alhandra - treino domingueiro


domingo, 11h, alhandra, zona ribeirinha.
o rodrigo foi dar uma força à equipa. eu tinha um treino para fazer. a ciclo via entre alhandra e vila franca está apetecível. o calor era intenso, cerca de 28 graus. mas à medida que mais sabemos do prejuízo de correr com calor tórrido, mais erros cometo. é que para aproveitar todas as ocasiões e não desperdiçar qualquer pedaço de tempo, tenho que balancear entre o útil, o agradável e o sensato. mas lá segui, ciente do risco e do prejuízo.
comecei em direcção à fábrica da cimpor em alhandra. a prova de canoagem começava e o colorido dos kayaks, dos coletes e das pagaias animava o passeio marítimo. o sol mimoseava os canoístas com a alta temperatura e com um rio calmo, apesar das correntes serem sempre traiçoeiras e fortes nesta zona. na praceta do restaurante “voltar ao cais”, denominada “avenida baptista pereira” voltei, para rumar a vila franca de xira. encontrei de imediato a minha colega sénia, que com o marido e filhote passeavam e desfrutavam da belíssima manhã. passando pela equipa de kayak acenei e desejei boa sorte a quem por ali andava.
alhandra é uma daquelas vilas onde respiramos o tema da pesca e os rituais de antigamente, onde os homens jogavam cartas no dia de descanso da faina, as mulheres punham a conversa em dia, às portas, no intervalo de todas as tarefas diárias que nunca abrandam, nem no dia de descanso.
velhos armazéns dão abrigo a barcos algo degradados, ao espaço para o sporting clube de alhandra – secção de canoagem e ao pó e humidade dos que perderam irremediavelmente os donos, o interesse de investidores e os resquícios da actividade económica que animava alhandra há algumas décadas.
hoje assemelha-se a uma vila de dormitórios em busca de uma identidade que lhe escapa nesta transição louca entre as rotinas artesanais, a indústria que tenta sobreviver e o corre-corre para lisboa, de quem trabalha nos serviços – um sector tão amplo que até tenho por vezes dificuldades em explicá-lo aos meus filhos, pela sua intangibilidade e ausência de “produto” palpável …
alguns edifícios novos, que albergam iniciativas culturais e despotivas tentam sacudir as teias de aranha do esquecimento a que a vila foi devotada nos últimos anos.

a ciclo via é um espanto. arranjada, com cheiro a novo. passei pela piscina “baptista pereira”, uma homenagem ao homem que também deu nome e glória à terra de alhandra, com os seus feitos na natação de águas abertas, especialmente com as suas conquistas nas travessias do canal da mancha. logo a seguir à piscina, surge uma curva onde está instalado um mini circuito de manutenção, semelhante ao que existe no jamor, na zona da canoagem. muita gente circulava a essa hora: uns a passar pelas estações desse circuito, outros de bicicleta, outros a pé, quase todos em família.

o rio, mesmo ao lado, corria imune e surdo a esta actividade pacata e domingueira. os atletas da prova de maratona que tinham um circuito mais longo, tentavam aproveita da melhor forma as correntes, já que a viragem era perto de vila franca. do outro lado da margem a lezíria, imponente, recebia o sol a pique e vergava-se em toda a sua robustez perante esse “agressor” que mais do que inimigo, é o aliado que lhe dá a força e a imortalidade.
seguindo à torreira, rapidamente se chega a uma mini estação de comboios, um apeadeiro, onde apenas existe uma bilheteira automática, mais um sinal de que o olhar e as mãos humanas estão arredados do contacto pessoal para tarefas menos, menos rendíveis. pessoalmente, já me aconteceu precisar de uma informação em estações de comboio ou metro e não ter uma voz a quem me dirigir, pois quem está par anos servir é a máquina. sinais da revolução da era da informação. mais eficiência, menos troca de afectos e emoções.
nessa zona, ainda, uma placa com informação sobre o tipo de aves que abundam nesta zona do estuário do tejo. informação simples, clara, bem conseguida para quem anda com as crianças a passear, e pode aprender e ajudar a aprender.
em simultâneo com os comboios que passavam, para lisboa e rumo a norte, chegava à zona da praça de toiros – palha blanco, onde há pouco mais de 1 ano tivemos um momento único de convívio e amizade com o nosso querido amigo a. luís, o melhor atleta da zona da lezíria, que não pôde vir treinar comigo porque lhe liguei em cima da hora. talvez tenha sido o meu receio de levar um bigode e de desidratar para o acompanhar no seu passo célere e decidido :).

rapidamente cheguei ao final da ciclo via, à fábrica de descasque de arroz, abandonada e com os cartazes camarários da confirmação do perigo de aí circular. pela informação pesquisada percebo que a câmara municipal de vila franca de xira tem um projecto para essa zona. assim aconteça, pois sendo uma zona nobre, terá tudo a ganhar com a sua revitalização.



voltei e em tronco nú, a assar num espeto voluntário, regressei a alhandra.
continuei a cruzar-me com muitas pessoas de bicicleta e a caminhar. as fontes de água estavam secas – um aspecto a melhorar, talvez pela câmara municipal. à minha direita erguia-se o cemitério de vila franca de xira. algo de indescritível, pois já há muito deve ter passado o seu prazo de validade. claramente para além das respostas possíveis à “procura” o cemitério foi crescendo encosta acima e hoje ocupa um espaço talvez escusado naquela zona quase central e ribeirinha de vila franca. terá já alguém pensado em construir um novo cemitério? é que não me impressionando por aí além esse facto, não me parece agradável para quem passeia e desfruta do lazer desta pacata vila, ou para quem vive ali mesmo ao lado, ter que coabitar com a morte, pelo menos com a proximidade de comensais à mesma mesa.
mas talvez esteja a ser exagerado, e nas tradições da terra encontremos uma razão para esta continuidade.
mais à frente as instalações da marinha – creio – onde os oficiais faziam parte da sua recruta e treino há uns anos. tem também um aspecto abandonado, como algumas das infra-estruturas em redor.
o regresso foi “quente”, pelo mesmo caminho. chegado ao fim da linha, ainda andei pelas ruas do bombeiros de alhandra e cheguei à rotunda da cimpor, antes de voltar e terminar junto ao cais, ao coreto e à prova de canoagem. tinham-se passado 1 hora e três minutos. o treino era para ser um pouco mais extenso, mas … não deu! o calor era muito. foi o possível, mas soube muito bem. sobretudo treinar numa zona pouco habitual, junto à água e com tanta história para ver de perto.
nas mesas junto ao rio, abrigados pelas palas providencias, os “velhos” continuavam a sua sueca domingueira, refrescados pela “mines” e pela nostalgia dos tempos em que os barcos mandavam na economia da terra.
ab - tartaruga

1 comentário:

Anónimo disse...

Amigo.
Mais uma excelente narrativa de mais um treino, agora com a uma descrição pormenorizada da zona de Alhandra e Vila Franca Xira.
Foi pena realmente não poder estar presente, tinha muito gosto de fazer mais um treininho consigo.
Fica para uma próxima.
Abraço