quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

O tempo do tempo

chegava ao reduto. pela hora do almoço, quinze minutos após ter saído do escritório, estacionava.
árvores, silêncio qb., um ou outro carro, um ou outro corredor.
rapidamente a corrida tomava a dianteira. não havia muito tempo. o tempo moderno é uma/um amante insaciável. corre-se sempre, mesmo não correndo, por causa desse tempo. não dá tréguas e tende a vestir-se de "controller" (um outro termo muito moderno).
ainda assim, após cinco minutos de aquecimento, tudo esquecia. até o tempo e a sua omnipresença. a hora era de almoço para muitos. ou de disfarce de almoço, para alguns.
mas ali, naquele que era um verdadeiro templo, o momento era de contemplação.
o verde dominava a paisagem e os caminhos. o dia primaveril juntava-se ao exercício e fazia subir a temperatura corporal.
nos caminhos do reduto, felizmente não o último, mas um dos mais importantes, procurava a sombra. ao passar na pista de canoagem, a céu aberto, com o sol a pique, apetecia um mergulho. os patos deleitavam-se a chapinhar. a água fresca acendia o rastilho desse desejo fresco.
um ou outro corredor. mas o verde, sempre o verde. a relva, a natural, aparada, regada, viva.
o silêncio. o tempo, esse outro dentro do outro tempo, que também pode ser sereno.
a corrida aproximava-se do final. no marcador do tempo e da distância surgiam números: 8.260m. o tempo medido em metros. oito mil, duzentos e sessenta metros, passados num templo.
abandonava o templo e o tempo dentro do tempo, pensativo.
afinal, com um pouco de vontade, ainda conseguimos domar este/esta amante insaciável. basta usar um pouco da sua própria substância.
porque o tempo nos redutos depende apenas de os procurar. e aí constroem-se os templos, à medida de cada tempo.

ab

6 comentários:

Luis Correia disse...

profundo, sincero, honesto.

um excelente texto que contrasta com a lufa-lufa que nos habituámos a cumprir como se não houvesse amanhã.

tempo, aquele a que costumamos chamar 'nosso inimigo', mas que na verdade é apenas uma desculpa para a nossa desorganização. algo que está na alma de qualquer português que se preze :)

António Almeida disse...

Caríssimo António Bento

excelente!!! gostei muito de ler.
Continuação de bons treinos.

Nadais disse...

antónio,

parabéns pelo texto, estou a matutar a tempos um nessa linha, mas continua fragmentado.

acho que agora com essa lufada na cabeça, espero que nasça.

forte abraço,

valeu!

nadais

Divinius disse...

Gostei de ler:)
A LUZ QUE TE DEIXO É DA COR DA MINHA VIDA...)

Fátima Lopes disse...

Excelente texto!

Bonito! :)

Bj

Eu, Corredor disse...

Caro companheiro,
só hoje descobri por mero acaso o seu blog.
E de facto, consigo entende-lo perfeitamente em muitas situações que descreve. Tanto na corrida como na vida, temos sempre de lutar e lutar e lutar. O que interessa é nunca desistir.
Irei com certeza ser um leitor assíduo do seu blog.
tomei a liberdade também de fazer o link do seu blog no meu, uma vez que andamos quase dentro dos mesmos temas. A corrida, a vida.
Um abraço
Nuno

http://eu-corredor.blogspot.com