sábado, 20 de dezembro de 2014

Do lavagante à subida "canhão"

ontem foi dia do 1.º jantar - com o mote sempre facilitador da época natalicia - do grupo das bicicletas de domingos e afins.
num restaurante pequeno, quase despercebido aos olhos mais distraídos, curiosamente nas traseiras da praceta onde vivi até aos 10 anos, onde cresci e aprendi, talvez, o que interessa e as fundações, e onde antes, nesse tempo, passávamos por um carreiro pelo meio de um canavial.
na ementa, com prévia reserva um folhado de lavagante e um pato no forno. um bom vinho alentejano para empurrar e uma mousse de chocolate com amêndoa moída para fechar, que coisa maravilhosa.
eu que não bebo café, geralmente, até nem quis sair sem um, pois estava mesmo a pedir.

para além da sempre muito agradável companhia - OBRIGADO JM, NL, CT e PA - seja nos pedais, seja na mesa, e contando sempre com as habituais piadas foleiras, picardias e troças marotas, há que louvar o esplendoroso manjar - a repetir pois claro, o baixo custo da coisa - outra agradável surpresa, e mais um atrativo: negócios à mesa.

no relaxe de um excelente momento de convívio adquiri a minha primeira bicicleta de estrada a um dos convivas, creio que num negócio de ganha-ganha. seguindo os melhores conselhos, dos experientes randonneurs dos quais um estava mesmo ali ao meu lado, comprar em 2ª ou 3ª ou 4ª mão, desde que em bom estado, vale geralmente sempre mais a pena do que comprar novo. e assim foi. amanhã vou vê-la de manhã e vou buscá-la ao final do dia.
a semana natalícia promete ser de motivação e inspiradora :).

agora, abrem-se outras perspetivas, pelo menos ao nível da eficiência e da melhor gestão do tempo, fazer igual, ou mais quilómetros, com menos dispêndio de esforço e tempo. não tirar tanto tempo à malta cá de casa, mais tempo para partilhar e para proveito próprio ...!

à partida, só vantagens. conheço a bicicleta, está em bom estado, tem material de boa colheita, um belo carbono de há 14 anos ...! contando que a minha atual GIANT todo o terreno já leva 23 anos e não sou propriamente o melhor tratador de bicicletas, conto andar pelo menos mais 9 ou 10 anos com esta TREK. e melhor ainda, é vermelha, vermelhona como o nosso Glorioso, a cor inspiradora.

no meio da janta sai uma informação sobre uma subida - eu gosto e procuro os desafios das subidas - lá para os lados de são marcos/barcarena.
ficou logo claro que hoje bem cedinho lá estaria. e assim foi!
saí pelas 6:45m (nem percebi que deviam estar perto de zero graus, pois a malta cá de casa disse-me há pouco que pelas 10h estavam 4,5 graus na rua). senti algum frio, é verdade, mas o foco estava na subida canhão.

antes ainda o tempo de lembrar que o PA regressou a casa, do jantar, de bicicleta, e que na marginal me meti com ele por duas vezes; ele sempre bem iluminado a provar que em segurança e com cuidado na visibilidade o perigo de circular de noite é bastante reduzido se todos cumprirem as regras.

segui até paço d'arcos, subi ao Tagus Park e meti depois para a estrada de são marcos. um quilómetro adiante começo a descer e lá avisto a descida canhão. flirtei a moça para a ir conhecendo e chegado lá abaixo fu idar uma volta a são marcos velho para subir e descer mais um pouco, conhecer melhor a zona e preparar a subidinha.

pois teve que ser, custou é claro, ficou o lavagante a meio da subida, o pato começou a gastar-se mas ainda sobrou, e nem foi preciso dar muita leveza às pedaleiras. temos aqui uma subida pior em algés de cima e as de barcarena, e a caminho de queluz de baixo, também são mais duras.

foi um excelente início de manhã, um pouco mais de 40 quilómetros para aquecer para o duche, nada de grandes trânsitos, mais um nascer do sol bonito, perto do mar. muito sereno.

OBRIGADO companheiros de jornadas pedaleiras e gastronómicas, valeu mais um belo momento.
um abraço, bom fim de semana e amanhã temos mais pedal!

domingo, 14 de dezembro de 2014

A Linha

Invariavelmente pedalo cada vez mais no sentido da linha do Estoril/Cascais.
Não deve ser apenas porque a conheço como a palma da mão, porque lá cresci e vivi durante 27 anos, porque tem água, praia, pôr do sol e lua cheia, alvorada e sol quente em dias frios, logo pela manhã.
Não deve ser apenas porque os meus pais, o meu irmão, os meus amigos de infância moram lá.
Nem deve ser apenas porque tem a Bijou, a boca do inferno, os passeios marítimos e ciclovias, a vista das mais lindas do mundo, o encanto de um pequeno paraíso.

Quando quero fazer 100 quilómetros já tenho o percurso certo, casa, cascais, guincho, cabo da roca, almoçageme, praia grande e volta.
Quando quero fazer 60, siga ao cabo raso e volta.
Quando são 50 e tais, pois também é por ali.
Sozinho ou acompanhado desfruta-se sempre, total e intensamente da linha.

Talvez seja, só talvez, uma questão de raízes e memórias. Voltar aos locais onde nos fizemos e que nos ajudaram a fazer, e onde fomos (mais) felizes do que infelizes tem destas coisas. É um regresso a um habitat, ao país da infância e da felicidade, da inocência, que nos ajuda (me ajuda) a focar, a revitalizar, a perceber os caminhos que fiz e escolhi e, de onde parti.

E não se consegue explicar a lua cheia na passada 6ªf de noite, nem o paredão de cascais apenas para nós, iluminado pelos holofotes e com o mar a açoitar as rochas e as pedras e a atiçar-nos a sua selvagem força. Tão pouco se explica o nascer do sol, geralmente em paço D’Arcos pelas 7:30h da manhã, já com 20 a 30 minutos de pedal e a senhora que tantas vezes lá está a fazer a saudação ao sol.

Ou ainda a improvável senhora/moça que hoje de manhã, pelas 9 horas na praia da conceição lá estava na areia, de biquini e logo de seguida na água a banhar-se e a nadar … com muito poucos graus cá fora e certamente lá dentro, um hino ao controlo do corpo pela mente, certamente.


A linha, esta linha, sempre na minha vida, para sempre nas minhas memórias.

sábado, 15 de novembro de 2014

Um passeio de sonho - Douro Vinhateiro 200 km

Nota: Todos os créditos fotográficos para Pedro Alves@Randonneurs Portugal.



Mais de um mês depois é a altura para relatar o que foi a extraordinária experiência do brevet de 200 km do Douro Vinhateiro. As palavras certamente não traduzirão a maravilha que nos foi dada a ver e a sentir, bem como a dimensão da beleza e do encanto deste pedaço de património da humanidade.

Chegados de véspera e instalados no glamouroso edifício do Inatel de Entre-os Rios, a manhã começa com a Rita semi acordada, entre o ensonado e o radiante por dormir num hotel, a dizer que queria morar ali, e a confirmação de que a checklist estava toda picada.
Seis horas da manhã, toca a levantar, despachar, confirmar tudo e seguir para o pequeno almoço que simpática e excecionalmente nos foi permitido tomar a partir das 06:30h. os rapazes repousavam em quarto próprio e já não os vi de manhã.
Teriam um dia de passeio pelo Douro, de carro, barco e comboio histórico.
No pequeno almoço o José e o Manuel, equipa organizadora, geriam os acontecimentos e também se preparavam para pedalar todo o percurso com os participantes.
Logo de seguida o Carlos e o Pedro. Iriamos partir os 3 juntos e logo se veria o que dava o dia. Uma espécie de ferrari com um paris-brest-paris no curriculum, um ford focus a fazer a rodagem e um Chevrolet de há 20 anos, bastante fora de moda e olhado de lado, já com umas subidas no lombo. Interessante, no mínimo.

Sem grande margem para nada que não fosse apanhar a bicicleta na arrecadação do hotel, verificar e mochila, fazer o bike check e ainda ter que mudar a pilha à luz traseira, pelas 7 da manhã lá nos fizemos à estrada. Saídos à esquerda do parque do Inatel começamos logo a descer e a sentir o frio da manhã. Decidira sair de calções, crente de que o dia estaria quente, mas ainda duvidei da bondade dessa decisão.
Percebi também que me esquecera de impermeável. Caso o tempo mudasse estaria em apuros.

Chegados lá abaixo a Entre-os Rios passamos a ponte sobre o Tâmega e somos brindados com uma primeira visão magnifica, o dia ainda a acordar, meio noite, meio dia e o rio sereno, uma tranquilidade à prova de tudo.

Era a hora da primeira subida que teria uns quilómetros e seguimos passando por terras como Várzea do Douro, Alpendurada, Granja, Aldeia Nova (a remeter-me para as raízes da outra Aldeia Nova alentejana), São Lourenço do Douro, para começar.
A vista era demolidora, com o sol a nascer e a banhar o Douro com a primeira luz da manhã. A vista era inenarrável, olhando à direita e para baixo, as encostas rendiam-se ao rio, em absoluta comunhão com todos os elementos, num amanhecer inesquecível.
Após mais um conjunto e uma dúzia de terras e lugares, descemos para a Pala, num trajeto para dar descanso às pernas e desfrutar de um momento antes de uma nova subida, bem mais dura

Gosto de subir de bicicleta. É um desafio único, não tanto para subir depressa, mas para sentir toda a energia necessária e toda a energia cinética que conseguimos gerar para produzir um resultado, subir solidamente, subir com potência, ter o controlo do que naturalmente é duro e difícil. É sempre uma experiência única, pois está garantido um resultado positivo, seguindo mais ou menos devagar. A biomecânica ao serviço de quem pedala vê-se e sente-se melhor nas subidas.

Passada a primeira subida ou conjunto de subidas com cerca de 8 quilómetros, iniciámos o segundo conjunto, que teriam cerca de 10/12 quilómetros e passaria numa zona mais acima das encostas e que proporciona uma vista diferente, não de rio, mas das encostas mais interiores, socalcadas com vinha. Verdes, lindas.

Entre as muitas terras por onde passámos sobressaiu-me Gaia, não a outra mas esta mais pequena, Valongo, Ervedal (também esta a lembrar-me as raízes alentejanas de Ervidel). Aqui, já de novo com o rio na mira, rapidamente chegámos a Frende, o primeiro posto de controlo, cerca dos 50 e poucos quilómetros. Numa bomba de gasolina carimbámos a passagem, comemos e rapidamente seguimos viagem pois as subidas não deram margem para grandes paragens. Com meia hora de avanço face ao fecho do posto de controlo, teríamos que recuperar andamento para almoçar com calma.

A partir de Frende e com destino à Régua o trajeto é a descer e bastante agradável para desfrutar do rio lá em baixo. Já em plano e paralelamente à linha do comboio, lado a lado com o rio, passamos por Bebereira, Granjão, Caldas de Moledo, entre outras, podemos observar a sua constituição, a sua força, imaginar toda a vida que vive por debaixo da superfície. E sentir que qualquer tentativa para forçar ou domesticar uma força destas será algum dia inútil. A rebeldia vive nos redemoinhos, nas correntes, nos nós e na malha de forças que ora conflitua, ora colabora, nessa massa invisível que faz mover tudo.

Na Régua uma passagem rápida, muitos turistas e muitos barcos, muitos carros também a fazer-nos apressar a passagem para voltar a respirar mais puro. Era o tempo de passar mais uma ponte, atravessar o Douro e seguir para Pinhão, vinte e poucos quilómetros em plano com pequenas oscilações, lado a lado com o rio, agora na margem esquerda e com as grandes quintas produtoras e as vinhas como companhia. A cor predominante era o verde amarelado, o cheiro era o típico dos locais onde se vindima e produz o melhor sabor dos deuses. A história do vinho do porto, dos vinhos do Douro, a história e cultura de uma região iam-nos passando ao longo do passeio, com o nome das quintas em relevo e com elevado tacto para a publicidade e visibilidade. Quinta D. Matilde, Quinta do Pêgo, Quinta de Santa Bárbara, Sandeman, Quinta Rosa dos Vinhos do Porto, entre tantos outros sinais dos tempos, das gerações, da história de Portugal. Um festim para os sentidos e para a memória física.

Perto do Pinhão percebemos que havíamos ganho perto de 1 hora e vinte face ao fecho do posto de controlo. Situado num hotel idílico à beira rio e logo a seguir à ponte, colocava-se a questão de almoço ali ou dar a volta e regressar após os primeiros 100 km. Com algum avanço face ao tempo estimado decidimos seguir e parámos a uns 5 quilómetros para almoço, numa mesa onde se haviam juntado mais três randonneurs (antes, já nos tínhamos cruzado com mais 3 que faziam o trajeto de regresso).
Sopa, sandes de queijo e uma maçã assada deram descanso à gula, permitiram um bom momento de descanso de cerca de 30 minutos e alguns alongamentos, sempre benéficos nas paragens.

Era tempo de seguir. Até à zona da régua teríamos mais uns 20 quilómetros antes de começar a subir para Resende, o próximo posto de controlo, cerca dos 150 quilómetros. O trajeto novamente em plano ia-se fazendo na companhia do douro e dos barcos turísticos que navegavam Douro acima, na sua maioria bastante vazios.
Passada a Régua era tempo de avançar pela nacional 222 rumo a Cinfães. Faltam cerca de 25 quilómetros, a maior parte dos quais serpenteando pelas encostas da margem esquerda do Douro, e quase sempre a subir. O cenário da manhã repetia-se, quando mais subíamos mais abrangente e deslumbrante era a vista. Lá em baixo muitos cruzeiros iam e vinham do Porto, deslizando pelo manto calmo do rio guardados pela imensas e ingremes encostas e por todo o verde e vinhedo que os escoltam em permanência.
A história deste terceiro troço era a de subida aos subida, curva após curva, com umas descidas de permeio, que davam para descansar mas deixavam o sobreaviso de mais subidas.

Chegados ao terceiro posto de controlo em Resende, com quase duas horas de avanço em relação à hora do fecho deu para comer bem, alongar, conviver. Foi neste posto de controlo que quase todos os randonneurs, com exceção dos 2 mais adiantados, se preparavam em conjunto para o troço final.
Foi curioso ver 11 pessoas com motivações, uns semelhantes, outros diferentes, com bicicletas também diferentes entre os carbonos, titânios, alumínios, aço, estrada, BTT, touring, enfim, para todos os gostos, prestes a avançar para novas subidas, para ingremes descidas, para uma etapa final em busca do motivo de cada uma, da realização, de mais um punhado de horas de plenitude nas suas diferentes e variadas formas.

Saídos em grupo descemos meia dúzia de quilómetros para iniciar mais subidas e o grupo começou a partir. De 11 rapidamente se formou um grupo mais avançado de 5/6 e pequenos grupos de 2. A paisagem continuava deslumbrante e o tempo começava a mudar ligeiramente. Ainda sem chuva mas mais cinzento, a temperatura ia diminuindo e era tempo de acelerar.

As pernas estavam ótimas, a moral em alta, as subidas iam desfiando, uma de cada vez. Liguei as luzes por uma questão de precaução, a estrada era traiçoeira e nestas coisas nunca se sabe se na próxima curva não vem um carro e é sempre melhor estar prevenido.

A certa altura os que conheciam o percurso começam a avisar que estava quase. Eis-nos que chegávamos à ultima grande subida, para Cinfães. Não era tanto a extensão, talvez uns 6 quilómetros. Era a inclinação e o facto de já termos cerca de 170 quilómetros em cima. Lá nos fizemos, um metro de cada vez. Havia quem fosse falando. Eu ia calado, concentrado e sobretudo a tentar gerir a energia. Muito dura, com inclinação crescente. Pela primeira vez no percurso e após tanto pedalanço tive que recorrer à pedaleira pequena à frente, algo muito raro. Havia companheiros que repousavam ao lado das bicicletas. Eu sabia que não podia parar, subir com uma bicicleta de 15 quilos pressupõe ter que manter sempre a geração de energia, manter sempre em movimento, não parar, sob pena de custar mais depois. Fiquei sozinho pois fui avançando e ganhei algum avanço ao grupo em que ia integrado.

Lá segui, tentando contraria a acumulação de lactato, a respiração ofegante e o sentimento de que aquela subida nunca mais acabava … perto de Cinfães, já lá bem em cima a estrada estava em obras sendo necessário redobrar o cuidado. Também decidi não parar. Com tempo de sobra, mas com a noite a cair e os primeiros pingos a ameaçar, preferi jogar pelo seguro. Estava já a relaxar depois da subida, as pernas continuavam em força, mais meia dúzia de quilómetros com mais uma ou outra subida (agora eram todas leves, em comparação com o que já tínhamos passado) e de repente eis-me a descer, rápida, muito rapidamente, numa estrada também em obras, quase a pique em alguns casos. Foram para aí uns 4 quilómetros de loucura a descer, embalado, cabelos ao vento (figura de estilo claro J), em puro gozo, mas também com muito cuidadinho. As primeiras pingas começaram a cair e a estrada iria ficar molhada daí a pouco. Para além disso as descidas eram também em curva e contra curva, apertadas e com trânsito de frente já com anoite a cair.
Rapidamente vejo a placa de Castelo, Castelo de Paiva e passo numa ponte antiga, medieval, sobre o rio Paiva. A vista é linda, ainda consigo ver o rio antes de anoitecer totalmente, mais um cenário magnífico.

O final da aventura está perto. Em Castelo de Paiva brindo-me com uma paragem para meter as 2 últimas bolachas e esvaziar a última garrafa de água. Faltam meia dúzia de quilómetros. As horas indicam-me que estou com uma hora e meia de avanço par ao tempo limite. Faço-me novamente à estrada, calmamente, passo a ponte sobre o rio Douro, agora já muito perto de Entre-os-Rios e subo a última subida até ao Inatel.

Passavam 12h20m desde o início da jornada, uma hora e dez de avanço face ao limite. À chegada o primeiro grupo já estava em amena cavaqueira e foi festejada mais uma chegada. Em amena cavaqueira continuamos à espera dos restantes companheiros de jornada.
A noite terminou co um jantar com as famílias, para comer um excelente bacalhau e desfrutar das histórias do dia e do momento de realização que se sente logo após terminar um evento destes.

Para o ano há mais, certamente, foi um passeio fascinante e muito ficou por ver tal a riqueza da paisagem e do caminho.

Obrigado ao Pedro e Carlos pela companhia mais próxima, ao José e Manuel pela organização e ao restante grupo pela camaradagem.

domingo, 5 de outubro de 2014

Lições Aprendidas – jornada dos 300 km

Não mais do que senso comum, que com o passar de todos os dias se revela sempre a base de qualquer estratégia e resultado.

1.      Objetivo bem definido
O objetivo era simples: chegar junto da família, de bicicleta, em autonomia, num percurso realizado numa única jornada.
Adicionalmente: percorrer 300+ km até 20 horas.

2.      Plano
Ter sempre um plano. Nem que seja para não cumprir. Assim como não há nada mais prático do que uma teoria, também não existe nada que ajude mais a concretizar um objetivo do que ter um plano.

3.      Várias vezes um pedaço = objetivo mais facilmente concretizado
300 km são 6 vezes 50 km. São 6 etapas, 6 objetivos, os quais se vão controlando, monitorizando o desempenho e servem, cada um deles, para picar a checklist, ganhar motivação e saber que se está mais próximo.

4.      Comer e beber e descansar
Seja qual for a distância, comer e beber bem, corretamente e atempadamente, é a única forma de a cumprir. Sem combustível, durante tantas horas, não se chega ao final e pode aleijar. Descansar também é nuclear, nomeadamente quando a saturação de pedalar começa a manifestar-se. Alongar é um benefício nos tempos de descanso.

5.      Ouvir … o corpo e a mente
Tanto tempo a pedalar significa que pode acontecer qualquer coisa a qualquer momento.
Vigília máxima é condição essencial. Estar a tento a todos os sinais. Perceber que a dor, sem ser aquela aguda, se anula com a cabeça. A dor no rabo, a dor nas pernas, a dor nas costas, conseguem minimizar-se focalizando no objetivo último e ganhando motivação com os objetivos intermédios.

6.      Nunca inventar
Não devem utilizar-se nem praticar novidades em percursos tão longos. A distância e as variadas condições do contexto são por si já novidades a que tem que se dar resposta. Invenções é sempre na preparação.

7.      Ter alguém com quem comunicar, vozes e ouvidos ao longo da jornada
Pedalar sozinho, num retiro é bom, mas é fundamental ter alguém com quem ir partilhando as incidências do percurso. Somos animais de grupo.

8.      Desfrutar do caminho
Tanto tempo em cima de uma bicicleta tem que servir, para além da realização pessoal, para desfrutar da paisagem e para ver, repito, ver, as pessoas. Não serve apenas olhar e seguir viagem.

9.      Não existem impossíveis
Há um ano estava a começar. Nem sabia se conseguia pedalar 100km. Desde essa altura já percorri mais de sete mil quilómetros com distâncias que variam entre os 50, 100, 200 e 300 quilómetros. Novos desafios estão à espera.

1.  A vontade e a estratégia mandam, não o material
Tenho uma bicicleta que pesa 14 kg, com 23 anos, uma clássica. Quis, sem material de estrada, sem fatos especiais, sem sapatilhas de encaixe, sem … fazer esta distância. Fi-la. Quando se quer não existem desculpas.

1.  Efeito da continuidade
Os resultados que se alcançam nunca são o fruto de meia dúzia de dias de preparação. Todo o caminho realizado conta, todas as experiências, todo o efeito acumulado da prática. A preparação para estes 300km não teria resultado tão bem se não tivesse já andado continuadamente de bicicleta desde agosto de 2013. Todo o passado alicerça as conquistas do futuro e tem que servir para aumentar a confiança nos novos desafios.

sábado, 4 de outubro de 2014

Ciclistas e carros ... antes dos 200 km do Douro Vinhateiro

Na fase final a preparação para o Brevet Randonnerus Mondiaux do próximo fim de semana (este é o último fim de semana, as últimas sessões com muito sobe e algum desce), que decorrerá em pleno Douro Vinhateiro, 200km de pura ... liberdade e fascínio, com partida em Entre-os Rios e viragem na zona do Pinhão, tive hoje o primeiro abalroamento por parte de um automóvel.

Numa rotunda já bem dentro, entra um veículo pela direita, e qual não é o meu espanto quando, parecendo um cavaleiro a sentir a investida do touro, vejo o carro preto em cima de mim, quase dando para dar uma palmadinhas no capot ...

lá deu para a senhora abrandar, ainda me tocou na roda traseira, guinei um pouco mas consegui não ir ao charco.
pura sorte, não houve técnica, foi mesmo ... porquenão teve que ser.

a senhora em pior estado do que eu saíu do carro quase em pânico mas felizmente acabou ali.
mais cuidado, pede-se aos atumobilistas e a nós ciclistas, pois todos os cuidados são sempre poucos.

entretanto aqui fica o aperitivo para a jornada do próximo sábado:

200 km Douro Vinhateiro

domingo, 24 de agosto de 2014

Etapa 6: Vila Real de Santo António - Cabanas de Tavira

Vila Real de Santo António – Cabanas de Tavira = 18,1 km

Total Etapa 6 = 18,1 km

Circular de noite pela ciclo via entre Vila Real de Santo António tem dois desafios de monta:
- a atenção necessária à entrada/saída de viaturas, que como referi antes, são autênticos quebra-cabeças, pelo desnível com que foram feitos;
- a atenção necessária às pessoas que caminham e que pedalam, na generalidade sem qualquer sinalização.

Acresce, o cuidado com os carros, que vindo em sentido contrário (a ciclo via está construída de frente para o trânsito), podem sempre tomar a decisão de encostar ou entrar sem sinalização numa habitação ou saída, e tornar a viagem mais complicada.
Faltavam dezoito quilómetros para fechar a aventura. Não queria que nada a detivesse antes de tempo. Com todo o cuidado e ciente do avanço de 1h40m face ao que me tinha proposto como plano, segui bem disposto e sem grande pressa.

Ainda me cruzei com dois jovens ciclistas que de chinela no pé devem ter achado ridículo alguém andar tão iluminado em cima de uma bicicleta e quando nos cruzámos, passados segundos, voltaram e deram-me um bigode. Durou pouco o sprint, pois mais à frente voltei a passa-los e estavam encostados à berma J.

Chegava o final da ciclo via e chegavam também os maiores problemas deste troço. Numa rotunda com uma bomba da BP a iluminar bem a estrada sigo no sentido de Altura. É um segmento com bastantes buracos, talvez uns dois ou três quilómetros infernais, sem berma, muito perigosos.

Como é possível que no espaço de tantos anos, sendo a EN 125 uma das mais concorridas turisticamente e que, por mais autoestradas que se façam, é a via de acesso aos locais onde os turistas desejam ir, não exista uma estratégia, um plano, um conjunto de ações, para deixar esta rodovia em condições? Como é possível que, ano após ano,  os buracos floresçam, o risco aumente para condutores e ciclistas, o espetáculo de degradação persista ?

Chegado a Altura, meia dúzia de metros com berma e duas rotundas e volta a estrada sem berma e cheia de buracos. Sendo 6ªf d enoite, circulavam bastantes carros e foi com muito cuidado que me fui aproximando e passando as várias povoações. Estava perto, muito perto do objetivo, do destino e do final da aventura. Passando as saídas para a Manta Rota e Vila Nova de Cacela, sem sustos, eis-me a subir pequenas oscilações na estrada, que um há um ano pareciam difíceis e que agora eram apenas um pouco de estrada menos plana.

Entre a saída para Cacela Velha e a Conceição de Tavira, um restaurante bastante iluminado, outrora um espaço multiusos que havia sido uma discoteca, um stand de automóveis, entre outras possíveis atividades, anunciava o Chiken Piri-Piri. Lá dentro meia dúzia de mesas deviam estar a degustar frango, presumo, altamente picante. Tentador, sem dúvida, mas agora faltavam meia dúzia de quilómetros, não era tempo para abrandar. Aumentei o ritmo, fiz-me à leve descida para a zona da Conceição de Tavira e com a rotunda à vista soube que já nada de menos bom iria acontecer, a mim ou à bicicleta. Radiante virei para Cabanas.

A descida, aquela até à passagem do comboio, a que sempre fiz de carro ou de autocarro, ou de bicicleta em trajetos curtos de férias, era agora a passadeira para chegar ao meu poiso, à minha gente. Mais obras, mais cuidado, uns quantos carros e chega a placa de Cabanas de Tavira. Faltavam poucos minutos até chegar a casa. Emocionado, acredito que todo o meu corpo sorria, seria um sorriso único, compactado. A última subida, a viragem à esquerda e após o aglomerado de prédios da urbanização próxima de casa, lá estava o portão.

E lá de dentro vinham vozes. Eram 23h54m. Dezoito hora e nove minutos após ter saído de casa em Lisboa, eis-me chegado. Duas horas menos do que planeara. Parei a escassos vinte e cinco metros de casa. Debaixo de um candeeiro inspirei a realização total, o sentimento do objetivo cumprido. Enviei as mensagens para os Amigos que durante o dia tinham dado o apoio e o incentivo, tão importantes. Olhei o céu Algarvio e senti o calor, o vento quente, o conforto da chegada.

A chegada, sempre ponto de conforto, sempre um ponto de uma nova partida, sempre, sempre, o momento único, fugaz, que se esvai num segundo, da felicidade total. Desta feita foi ali, debaixo de um candeeiro, comigo, como durante toda a viagem, em Cabanas de Tavira. Mais uma vez aí, após mais de quarente anos de conhecimento mútuo e de partilha de bons e menos bons momentos. A minha segunda terra, a primeira nas raízes.

Assim que me aproximei do portão, breves minutos depois, os sorrisos, os abraços, a festa tomaram conta de todos. A aventura começou a ser contada, os episódios iriam estender-se pelos dias seguintes. Antes de comer ainda foi necessário alongar, esse imperativo para que o depois fosse menos custoso.

Fisicamente estava ótimo, pernas muito bem, traseiro muito bem, tronco e pescoço ligeiramente tensos mas bem, disposição em alta.

Após petiscar, meti-me debaixo do duche exterior. Esperava água gelada mas devia vir tão aquecido que sentia a água morna. Revigorado senti que este era o segundo melhor duche da minha vida, após o primeiro, tantos anos antes no Hospital de Santa Maria.

Das lições aprendidas falarei num novo post.


As aventuras são assim, dão-nos um sentimento de felicidade e de realização e apontam desde logo para o depois, dado que o presente nunca existe. O que vale mesmo, pese o lugar comum, é o caminho, a decisão de dar o primeiro passo, todo o processo de planeamento e preparação, toda a excitação de conhecer o novo, viver o desconhecido, experienciar para partilhar, para contar, para sentir.

sábado, 23 de agosto de 2014

Etapa 5: Mértola - Vila Real de Santo António

Mértola – Vila Real de Santo António = 66,4 km

Total Etapa 5 = 66,4 km

Confiante e renovado fiz-me ao troço mais difícil. Sabia que teria meia dúzia de senhoras subidas, com inclinações de respeito e que teria outra meia dúzia, não tão inclinadas mas com uma grande extensão. Desde logo, e após ter deixado o café onde recuperara forças, tinha uma subida até ao castelo que não consegui visitar – na próxima J, seguida de uma descida vertiginosa e radical rumo a uma pequena ponte sobre o sereno Guadiana. Preparei as mudanças, pois vinha aí a primeira delas.

Durante talvez um quilómetro e meio foi a subir, a subir, a subir, bem até perto do sol, que a essa hora queimava mais do que nunca e mais perto do que nunca, a oeste, para onde se ia pondo. O calor acumulado nos 34 graus ao longo da tarde no asfalto alentejano é duro. Foi aqui que percebi a boa opção pelo lenço na cabeça, já lá iam perto de cinco horas. Caso contrário, estaria em apuros, tal era o calor e a bica de suor que não parava, qual cascata. Cada subida era um desafio e simultaneamente uma fonte de motivação, pois cada quilómetro passado, cada pedalada a subir, esperando pela próxima descida, era espaço percorrido, maior proximidade do final.

A margem face ao plano com que saíra de Mértola dava esse conforto, de rolar e poder parar mais vezes, beber água e comer uma bolacha.

Tinha particular cuidado com os carros que vinham nas costas, sobretudo em curvas mais apertadas e com menor visibilidade. Não havia muitos, não apanhei nenhum susto, mas a vigília nunca abrandou nesta fase. Mais uns quilómetros e mais uma descida ingreme, passando por um parque de lazer e terminando a pique numa ponte, antes da segunda grande subida. Custou menos, esta segunda, a primeira abordagem tinha corrido bem na subida anterior e a vontade fez o resto.

Determinado a não ceder, lá andei e parecia que ia custando menos à medida que subia. Por norma utilizo mudanças médias nas subidas, nunca vou leve de mais e assim tinha esse barómetro, consegui sempre manter uma boa relação nas pedaleiras, sem gastar cartucho. Lá em baixo continuava o Guadiana muito sereno, intocável, crente de que o fio de ribeiro que ia passando no verão se tornará um leito poderoso no inverno, tal o declive e a estrutura do vale. Apetecia descer lá abaixo e dar um mergulho para refrescar, mas a noite havia de chegar e queria entrar em terreno teoricamente mais seguro quando estivesse escuro.

Consegui manter, com algum esforço, um plano de paragens de vinte em vinte minutos para beber água e descansar dois minutos que fosse, pois as subidas iam deixando marca e o calor, apesar do adiantado da hora, era muito e desgastante. Não ainda havia sinais da noite e o sol galgava o seu caminho para repousar mesmo ali ao lado da minha cara. Continuava a suar em bica no final de cada subida, grande ou pequena.

Dez ou quinze quilómetros após Mértola parei num café de beira da estrada que sabia ser o último antes de Odeleite. A dona recolhia a placa na rua com a ementa e ia fechar. Perguntei se ainda me vendia duas águas geladas. Que sim, que entrasse. Perguntou-me de onde vinha e respondi … de Lisboa. A sua cara e surpresa foi um momento hilário, perguntando-me se vinha de Lisboa montado “nisto”. “Isto” era o meu trunfo para chegar ao Algarve, a minha mais que tudo naquele momento, o meu foguetão. Rindo-me responde que sim, que havia saído de madrugada e que ali estava.

Numa mesa três alentejanos bebiam cerveja e, devidamente alertados pela dona do café, logo teceram comentários sobre a aventura. O pessimista disparou logo que não chegaria antes de amanhã ao Algarve, que ainda havia muito. O neutro, mais factual, perguntou-me a que horas pensava chegar. O otimista brindou-me com uma tirada e um sorriso franco, que a seguir daí a cinco quilómetros havia uma descida imensa, logo a seguir à subida daí a pouco J, e que até Vila Real era sempre a descer. Brinquei um pouco, disse-lhes que chegaria ainda hoje e que sim, que o percurso seria melhor a partir de agora e com duas águas bem geladas fiz-me à estrada.

O sol agora já estava a desaparecer, a solidão voltava, não havia casas, não havia gente e de repente, depois da anunciada descida, dei por mim a entrar no IC 27. Bermas! Maior proximidade. Ao lado direito corria a estrada antiga, também ela abandonada, envelhecida, discreta mas mantendo o seu orgulho de quem foi uma via de total importância em tempos mais idos. O mesmo, praticamente, que no trajeto entre Beja e Mértola. Estaria a cerca de 30 e poucos quilómetros de Vila Real de Santo António. Mais ânimo. A noite caía definitivamente. A vigília continuava em alta, pois os carros vinham em grande velocidade. Apesar de bem iluminado, luz traseira, refletor no tornozelo esquerdo, colete refletor, luz dianteira, o cuidado nunca era demais. Alguns carros buzinavam para animar, outros buzinavam e ouvia-se umas bocas e risos, talvez a escarnecer, outros passavam tão rápido que só ficava o vento deixado à passagem.

Um sinal para acautelar ainda mais a viagem era a oscilação da bicicleta nas subidas quando me colocava em pé para ajudar ao arranque. Sinal de cansaço e efeito da noite e da menor visibilidade, que isto de pedalar para longe e de noite há quase 16 horas tem o seu impacto.

Para focalizar no que faltava, tinha um objetivo mais imediato, chegar à barragem de Odeleite para parar, comer, alongar um pouco. Seria a última paragem antes de Castro Marim e Vila Real. Faltavam nessa altura cerca de 20 quilómetros para chegar. Era noite cerrada. Comecei a ver água, à direita, já a barragem se anunciava no meio do escuro. A descida para Odeleite permitiu descansar um pouco. É que das seis subidas “fatais” as quatro últimas eram já em plano IC27. Não sendo subidas ingremes como na serra, após Mértola, eram bastante longas, sinuosas, e após duzentos e muitos quilómetros iam deixando marca. Uma mensagem do Pedro teve um efeito altamente motivacional. “A noite é amiga do Randonneur, pedalar a subir, descansar a descer”.

Em Odeleite na penúltima paragem, seria também a penúltima “refeição”. Uma sandes que vinha desde Lisboa e que se aguentou no caminho, uma garrafa de água ainda fresca e um ambiente indescritível, deram para relaxar e ganhar energia para o resto da aventura. A massa de água parada, prisioneira do Homem, impressionava, com a noite escura e com a lua a alumiar tenuemente toda a extensão da barragem. A bem do animal humano, aquela imensidão de água parada é o reflexo da subserviência totalmente ilusória, até um dia em que a rebeldia desta natureza escrava traga novamente ao de cima o selvagem curso dos rios, para a qual não existirá mão Humana suficiente para a enfrentar.

O silêncio era absoluto, um autêntico retiro, um inimaginável paraíso.
Pequeno, senti-me muito pequeno naquele momento, mas mais livre do que nunca, em total harmonia e serenidade com a envolvente.

Logo com uma subida no regresso à estrada, a novidade foi a luz dianteira (já com umas doze horas de tempo de vida em cima das pilhas) que acendeu o vermelho. Tinha pilhas suplentes. Decidi esperar mais um pouco, a luz duraria mais 20 ou 30 minutos, e mais à frente encontrei bastante luz, num nó de entrada e saída do IC. Para além de iluminado, sempre estaria em maior segurança a mudar as pilhas. Nesse momento uma mensagem do Nuno a perguntar onde ia. A caminho de Castro Marim, mas coisa menos coisa, meia hora para chegar. Logo de seguia outra mensagem a dar força, do Luís. A tanta distância havia gente que seguia os meus passos, havia Amigos que davam ânimo, havia ouvidos e vozes. A corrente que ajuda a renovar as forças.

Com as luzes mudadas, nova onda de energia, um sentimento de maior segurança naturalmente, com o caminho bem visível, e de repente … começo a descer, a ver as luzes cada vez mais e numa maior extensão e percebo que era Vila Real. Castro Marim estava logo ao virar da esquina. Começava uma nova frente na viagem, a saída do IC27 e de uma estrada bem tratada, para as estradas mais esburacadas e menos arranjadas, logo mais perigosas. Com o castelo de Castro Marim à vista e gente nas esplanadas a desfrutar do calor, apanho um ciclista à frente, a pedalar devagar no mesmo sentido que eu, sem capacete, com iluminação muito deficitária. Cumprimentei-o e deve ter achado que tinha passado o carrossel iluminado da feira de Castro Verde J. Segurança antes de tudo.

Chegado a Vila Real, na rotunda da entrada e saída da cidade era tempo da última paragem. Tinha duas bolachas com passas e iogurte, que o estomago agradeceu, mandei mais uma água abaixo e … faltavam dezoito quilómetros. Um mega cartaz à minha frente anunciava uma hamburgueria aberta até às duas da manhã. Tentador. Mas queria chegar rápido. Teria certamente alguma coisinha para comer à minha espera. Nada de distrações. Foi altura de deitar fora o lixo que vinha acumulando, garrafas vazias, pacotes de bolachas, as folhas onde conservara as sandes. Tinha ganho novamente algum tempo. a previsão de saída de Vila Real era à meia noite e meia. Havia chegado pelas 22h31m. Descansei durante cerca de 25 minutos e arranquei com uma hora e quarenta de avanço face ao plano.

Decidi seguir pela ciclo via, à cautela, de frente para o trânsito, que existe até pouco antes de Praia Verde/Altura. Conhecendo muito bem a EN125, numa 6ªf de noite, não quis arriscar. A ciclo via é demolidora, está mal concebida, em cada casa com entrada e saída de viaturas tem um desnível que mais parece um enorme buraco, mas ainda assim não tem carros!

Era tempo de redobrar o cuidado. Depois de tanto quilómetro não queria ficar pendurado, nem por furos, nem por alguma distração. A hora era para acabar em beleza.

Próximo destino, final: Cabanas de Tavira. Arranquei muito satisfeito, realizado e motivado, pelas 22h55m.

sábado, 16 de agosto de 2014

Etapa 4: Beja - Mértola

Beja - Mértola = 52,5 km

Total Etapa 4 = 52,5 km

Logo após a saída de Beja e com o regimento de infantaria do lado esquerdo uma placa assinalava obras durante perto de 10 quilómetros. O asfalto oscilava entre os buracos, o mau estado e o piso novo, a ferver, de alcatrão recém calcado. Com cuidado seguia na berma, que se apresentava ora em bom estado, ora esburacada. Rapidamente comecei a ouvir um barulho estranho na bicicleta, não percebendo a princípio do que se tratava.

Com o piso essencialmente a ajudar, em descida, o barulho ia aumentando e não percebia se era da corrente, dos pneus, se era algum furo lento, enfim … parei duas vezes para uma verificação rápida e já depois da viragem para Mértola percebi o que era. O alcatrão quente e muitas das pedrinhas soltas colaram-se aos pneus e ia fazendo um barulho contínuo, tec, tec, tec, …, que me tinha passado ao lado antes. Nova paragem e aí decidi, pedrinha por pedrinha, retirar todas as que estavam incrustadas na borracha dos pneus, sobretudo do da frente.

Assim que retomei a estrada, já sem barulho e muito mais aliviado, era tempo de dar ao pedal e aproveitar o vento de costas que se continuava a fazer sentir. Com várias descidas, o ritmo era compensado, face ao calor cada vez maior. Estaria talvez na hora de maior calor e para Mértola a temperatura estimada era de mais dois graus do que em Beja. Novamente, repito, tive uma sorte imensa, pois em vez de trinta e quatro graus, poderiam ter sido quarente e aí talvez tivesse sido necessário o plano B.

Era o tempo de olhar a paisagem, agora cada vez menos monótona, com campo, montes, com o gado a inventar pastagens verdes para certamente enganar a fome, com árvores de várias espécies. Era o tempo da solidão e da luta contra o calor, contra a sede cada vez mais permanente. Era o tempo de dirigir o pensamento para algumas palavras a uma árvore solitária, quem sabe a árvore que em alguns de nós vive bem no fundo do que somos e nunca nos abandona:


Ossuda, cinzenta, essencialmente desprovida de verde e de vida, sou aquela a quem mais amam.
Não possuo a beleza do tronco rugoso e forte, nem a copa resplandecente, ou sequer a solidez e a vitalidade castanhas; não darei nunca as folhas belas ou a sombra protetora, do quente inferno estival.
Mas, de entre todas, fui a que resistiu, a que vos resto, aquela que vos foi fiel, no curso das cores, texturas, estações; a que permaneceu de pé, convosco, para sempre.
Sou a testemunha, guardiã, anciã da extensão desta imensa e inacabável solidão, do abandono que vos legaram, campos doirados, tão despojados quanto rebeldes. Campos alentejanos que perpetuarão a resistência, a raiz do medo e do sofrimento, a continuidade; sou uma de vós, convosco, até ao fim.


Era esse mesmo, o tempo de em solidão e aproveitando as descidas, gritar, tão alto quanto conseguia, sem que ninguém ouvisse, ou existisse, ali, para ouvir; gritar o grito cá do fundo, da motivação, da liberdade, do júbilo de poder gritar sem incomodar ou ser incomodado, o grito da vida, da realização da felicidade por estar vivo, bem vivo, crente numa concretização, apenas uma, um retiro de um dia, que chegaria a bom porto, porque as concretizações devem ser vividas e desfrutadas uma a uma, sem misturas e sem sobreposições.

Essa foi a parte do caminho em que, sintonizando com os elementos extremos do Alentejo profundo, me permiti deitar fora o que criava pó nas entranhas, exteriorizar o sangue e a vertigem de sentir a harmonia com o campo, com a raiz de tudo, apenas eu, sem ninguém por perto, sem a civilização a atrapalhar esta comunhão. Foi este o tempo que em alguns minutos transportou uma vida e me deixou saber que chegaria ao destino, aos destinos que escolherei, com o sentimento da plena realização e agradecimento pelas oportunidades.

Levava perto de duzentos quilómetros e a partir daqui entrava em território desconhecido. Aproveitei uma bomba de gasolina a cerca de 20 ou 30 quilómetros de Mértola para uma paragem, ingestão e líquidos, compra de um gelado, um MAGNUM delicioso com amêndoa, compra de águas geladas e uma ida à casa de banho.

Na zona perto do balcão um Alentejano, penso que só poderia ser Alentejano, ferrava uma sesta olímpica sentado a uma mesa. Nem televisão, nem forasteiros que iam e vinham a pagar a gasolina, nem estes aventureiros que paravam para comprar gelados e águas, nada nem ninguém conseguia tombar aquele sono. De peito à mostra, barriga proeminente, barba por faze e bochechas tão redondas quanto vermelhas, assim vi Morfeu, creio que o próprio e não apenas os seus braços, que nos acolhem a todos, diariamente. Bem que desconfiava que Morfeu era Alentejano. Bate tudo certo quando passamos nos locais certos nas horas certas, tudo fica claro e não são precisas explicações.

Revigorado, o resto do percurso até Mértola teve umas pequenas subidas, como que a preparar para o embate na serra, na reserva do parque natural do Guadiana.
O cuidado passava, para além da gestão do calor, pela atenção aos carros e com a ausência de bermas na estrada. Muito atento e vigilante, totalmente focado, ainda havia margem para ver as casas que iam surgindo no meio de alguns montes e por entre alguma mata. Coragem, certamente, a de quem vive ali, isolado, resistente, imune a tudo, sujeito a tudo. Luta, decididamente, muita luta nessa errância pelos caminhos diários da procura.

Uns quilómetros adiante da bifurcação para Castro Verde, uma descida acentuada e eis que surge a placa a anunciar Mértola. Eram 18h10m e tendo mantido a cadência havia feito os 52 quilómetros em duas horas e vinte e nove minutos. Mantinha uma gestão, intuitiva, conservadora, cuidadosa, tal se mantinha o calor e a temperatura.

Ainda havia um segmento muito difícil, as subidas da serra, até Castro Marim e esta seria uma paragem fundamental, para reabastecer e para preparar mentalmente os 80 quilómetros finais. Parei num café muito simpático, comi uma sandes de queijo para acomodar o estomago com sólidos, uma coca-cola bem fresca e pus na bagagem mais uma água adicional gelada de meio litro.


Reabastecido, após novo contacto com os meus ouvidos ao longo da jornada, estava preparado para a parte mais difícil da aventura. Esperavam-me a serra, 6 subidas duras, outras tantas a ajudar à dureza, mas também as descidas. Esperava-me a noite, novamente a solidão, agora mais perto do objetivo, mas numa zona com mais perigos e menor visibilidade para os condutores, com mais incerteza, e praticamente sem qualquer vestígio humano ou posto de reabastecimento. Saí de Mértola pelas 18h37m, com cerca de uma hora e trinta e oito minutos de margem face ao plano, que previra a saída pelas 20h15m. A grande vantagem de poder gerir este avanço era realizar a parte talvez mais perigosa ainda de dia e entrar no IC27 com folga e já com outras condições, bermas largas e escapatórias iluminadas para paragem. Próximo destino: Vila Real de Santo António.

sexta-feira, 15 de agosto de 2014

Etapa 3: Canal Caveira - Beja

Canal Caveira – Beja = 61,2 km

Total Etapa 3 = 61,2 km

Saído do Canal Caveira com duas horas de avanço face ao plano era altura de começar a gerir o esforço e sobretudo o calor. O tempo estava ainda nublado mas a frescura da manhã ia-se dissipando. Como dica do maior guru, pela hora do almoço, tinha nunca esquecer os líquidos e pirar-me dali o mais rápido possível, pois era raro o sol estar a descansar até Beja, por estas horas.

Lancei-me em direção ao IP 8, rumo a Beja e nem de propósito, na curva que lhe dava acesso eis que rompe o brilho. Estavam lançados os dados para os próximos sessenta quilómetros, calor em crescendo e sol a bater bem lá do alto.

Pelas estradas tão conhecidas do “Alentejo” que percorria em pequeno quando ia para casa dos meus avós em Avis/Cabeção (a diferença entre alto e baixo Alentejo a nível do asfalto e do arvoredo não é muito nítida para um inculto como eu na matéria) ia seguindo ao sabor da onda de sobe e desce. Ao vivo, estava ali a diferença entre a expressão planície alentejana e a prática, quilómetro após quilómetro.

Mais uma vez não tinha muita noção do ritmo a que ia, mas percebia que estava a manter alguma cadência, cautelosa, dado que a temperatura começava a subir. Haviam previsto 34 graus para a zona de Beja e Mértola e era essa a baliza. Todo o cuidado era pouco no sentido de não acelerar muito, não esticar e ingerir líquidos de forma frequente.

Tendo saído do Canal Caveira pelas 11h58m, uma hora depois estava a dar notícias à família, a ouvir as vozes que me animavam e ia aproveitando para ingerir líquidos. Em Santa Margarida do Sado passa-se a ponte e apetece um mergulho, um pouco a norte um viaduto inacabado de uma futura (?) via rápida ou alternativa ao IP8 e continuava o sobe e desce ondulado pelo Alentejo, sereno, imponente, imortal, uma força natural que não se conta, que vive no sangue alentejano e na dureza das estações que aí embatem.

A caminho de Beja continuava a apertar o calor e eis que entre a fábrica do azeite “Oliveira da Serra” e Ferreira do Alentejo tomei uma decisão importante que me valeu certamente uma boa parte do bem-estar até ao final. Por baixo do capacete coloquei na cabeça o pano comprido branco, tipo legionário no deserto, para proteger do calor, a cabeça e o pescoço. Passado o habitual desconforto inicial, eis-me melhor protegido e mais descansado quanto aos efeitos do sol de chapa na careca.

Iam passando carros, camiões e tratores, uns apitavam incentivando, outros apitavam e gritavam de forma jocosa, outros ainda passavam mais ou menos depressa em total silêncio, uma rajada de vento breve e rapidamente passageira. Dois deles haviam de ser ultrapassados por mim já depois de Ferreira do Alentejo, um deles por ter sido mandado parar pela GNR Brigada de Trânsito, o outro com o capôt ao alto, a arejar, pois que havia tombado no quente asfalto.

A bicicleta continuava em pleno, o corpo ia dando bons sinais, sentia-me bem e de repente começo a ver as placas a anunciar Beja cada vez mais perto. Era uma motivação extra, estava a chegar a meio da jornada, a cerca de 20 quilómetros de Beja, psicologicamente foi um momento excelente, pois não tendo o corpo sinais de cansaço por aí além, era um bom tónico olhar para os quilómetros que iam ficando para trás, como parte do objetivo maior. O foco era ai, no que já tinha pedalado, no facto de, nem nas pernas, nem ao nível do assento estar a sentir dores relevantes, nem, ainda, no facto de o calor estar a dar cabo de mim.

Muitos pensamentos, muita reflexão, muitas caras, imagens e situações vieram visitar-me durante estas perto de três horas alentejanas de passeio ao sol. Os retiros no local certo têm disto, conseguimos ir esvaziando a mente, relaxando, ainda mais quando estamos no meio de uma árdua tarefa e de um objetivo ainda distante, mas para o qual já demos bastante e não há volta atrás.

Com as placas a indicarem o aeroporto de Beja e o sentido de Beja, estava quase radiante por ter chegado ao final desta etapa. Ainda tive tempo para passar em Beringel e relembrar uma sopa de cação que de tão fenomenal, há talvez uns dezoito anos, nunca a esqueci. Antes havia passado na tão famosa estalagem das Picanheiras, um local idílico para alguns colegas de trabalho, J, há muitos, muitos anos. Tal como quase tudo no Alentejo, também as Picanheiras resistem ao tempo e à espécie humana.

Já com Beja à vista é tempo para uma paragem estratégica, mais motivacional que outra coisa, sob a sombra de uma oliveira para fechar um powerade e para alongar um pouco. Logo depois a última bomba de gasolina antes de Beja, a rotunda de entrada na cidade e ali estava o LIDL, local escolhido para a paragem.

O ritmo tinha decrescido um pouco, mas eram 15h00m e continuava com um avanço de duas horas e meia face à hora prevista de saída de Beja. Calmamente procurei uma sombra, um local onde pudesse deixar a bicicleta segura com cadeado enquanto procurava um café no próprio LIDL. Foi também o tempo para avisar os ouvintes e seguidores mais diretos da aventura de onde estava e como me sentia.
Tudo estava a correr tão bem que não queria entrar na ilusão da facilidade, até porque o mais difícil ainda estava por vir. Aproveitei para alongar pernas e tronco e desfrutar das sombras.

Entrei no LIDL e recebo uma brisa fresca, reconfortante e que me permitiu durante uns minutos refrescar o corpo e sobretudo o ânimo. Não me havia lembrado que na filosofia alemã e utilitarista esta grande superfície existe para chegar, escolher os produtos entre filas extensas e paralelas, ir para a caixa, pagar e até à próxima. Nada de superficialidades como um espaço para tomar café ou sentar um pouco. Tudo muito “clean”. Saí, decidi não renovar os powerade e passar a beber apenas água e depois de levantar dinheiro na máquina ATM dirigi-me então a um café no espaço contíguo ao LIDL, um talho de grandes dimensões e aparentemente, volume de negócios, chamado tão a propósito “Matadouro”, em cujas instalações havia um pequeno café.

Era o tempo de sentar um pouco, comprar águas geladas para levar e comer e beber. Ainda tinha sandes (apenas havia comido uma no ferry de Troia) e meti uma boa sandes, o resto do terceiro powerade e uma barra (bolacha com iogurte e passas). Renovado o estomago, arranquei rumo a Mértola.

Tinha demorado três horas de dois minutos a percorrer os 61,2 quilómetros até Beja. Sem monitorização com conta-quilómetros e ritmo, tinha corrido muito bem, um ritmo adequado ao calor, ao trajeto de falsa planície, à gestão do que faltava ainda percorrer. Entrava agora numa fase crítica, onde seria vital gerir o esforço durante o calor e na “descida” até Mértola para aguentar sem sobressaltos os últimos noventa quilómetros.


Pleno de confiança, motivação e regenerado, fiz-me à estrada. Saí pelas 15h41m, com cerca de uma hora e quarenta e nove minutos de avanço face ao plano estimado de saída, treze minutos mais tarde do que na saída do Canal Caveira. Não estava nada mal para o primeiro embate com o calor alentejano. Não tinha sido necessário, até ali, acionar o plano B, descanso forçado numa qualquer estalagem ou residencial.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

Etapa 2: Troia - Canal Caveira

Troia – Canal Caveira = 56,1 km

Total Etapa 2 = 56,1 km

Após o descanso e enchimento durante a viagem no ferry, saí em Troia revigorado e pronto a dar forte no andamento. Arranquei pelas 9h10m, menos 1h20m do que a saída inicialmente prevista a partir de Troia o que era um bom sinal, sobretudo porque poderia evitar mais calor na zona do Alentejo profundo. Não deu para espreitar nada de Troia, a não ser a vizinhança de vivendas e espaços aprazíveis que a tornam uma das zonas talvez mais paradisíacas do nosso país.
Tomei a estrada em direção a sul, rumo à Comporta. De vez em quando iam passando um carro, e outro, e outro, muito espaçados.

A paisagem inspirava-me um misto de deleite com solidão; com o Atlântico à direita, tão próximo e poderoso, silencioso nesse dia ainda sem sol, e com uma brisa agradável a tornar menos pesada a viagem, e as zonas de pântanos e lodosas à esquerda, com a vista da Setenave lá mais longe, uma cópia da Lisnave, localizada na península de Setúbal, mas em tudo parecida, pelo menos vista da outra margem.

A estrada estava em boas condições e o andamento fazia-se sem grande cansaço, com vento pelas costas e com terreno essencialmente plano. O trajeto começava a ser monótono, pois não havia nem carros, nem pessoas. Aquele cenário selvagem, intocado e virgem, protegido, é bonito mas igual, durante grandes extensões.

Na zona da Comporta parei numa bomba e comprei finalmente o protetor solar. Dois dedos de conversa com a moça que estava de serviço e era hora de seguir.
À direita surgiam agora arrozais, extensos, num verde tão largo que a vista não lhe alcançava o fim. Pelo movimento dos carros que me iam ultrapassando percebia o horário dos ferrys, pois eram por levas.
Ia-se passando uma terra com meia dúzia de casas à beira da estrada, e outra e ainda mais outra, mas muito pouco sinal de pessoas.

A determinada altura não percebia sequer se estava com um bom andamento ou não, tinha-me deixado cair na monotonia e começava a senti-la. Começou a custar a pedalar, não pelas condições físicas mas sobretudo pela disposição e pela solidão. Ainda faltava tanto e não era bom sinal. Decidi parar, beber e comer mais uma metade de uma sandes, sensivelmente pelas 10h30m, o que queria dizer, pensava eu, que teria meio caminho percorrido até ao Canal Caveira.

Foi um tónico importante, a partir dessa pequena paragem voltei a ganhar ritmo, ou pelo menos a perceção de que ia com um bom ritmo. A bicicleta estava em ótimas condições, o corpo respondia, a motivação voltava e mais à frente começo a ver as placas a direcionar para Melides, Sines, etc., o que significava que estava a chegar perto.
A determinada altura a placa para Grândola e a entrada no IP1, para fazer a meia dúzia de quilómetros até ao almoço.

Aproveitando as características da estrada, com uma boa inclinação a descer, sentia-me voar. À esquerda um carro parado na berma, meio escondido, com uma perna e um salto alto a espreitarem pela porta do condutor aberta, a recordar que por aquelas bandas se mantêm atividades antigas, agora com mais mobilidade.
Já não passava nesta estrada há muitos anos e eis que surge a “torre” à vista, aquela torre que sempre anunciava a paragem para comes e bebes.
Assim foi desta feita e qual não foi o meu espanto quando olho para o relógio e vejo que era 11h26m e havia percorrido os 56 km em 2h15m, sensivelmente, um ritmo que me deixou de pé atrás, pois se por um lado me sentia bem, por outro ainda só levava um terço da aventura pelas costas e faltava o mais difícil.

Não sentia qualquer dor nas pernas e no assento, as que tive foi por volta dos 80 ou 90 km, o que é habitual e penso que seja a fase em que o corpo se adapta efetivamente à longa distância, após as três horas e meia ou quatro horas de esforço. E perceberia mais à frente algo que tenho constatado nas longas saídas: é um modelo binário, este, da gestão do esforço, quando surgem as dores ou há reação e se continuam e as dores param, ou não dá mais e acaba a brincadeira. E por isso a diferença é feita muito com base no plano mental, asseguradas que estejam as condições de treino de base.

No Canal Caveira decidi não embarcar em aventuras gastronómicas. Optei por uma sopa de legumes, bem nutrida e reconfortante, uma coca-cola e um pastel de nata. Foi igualmente altura de enviar uma mensagem à malta que me seguia mais de perto e que iam incentivando ao longo do caminho. Falei para “casa” e pouco depois tive oportunidade de trocar algumas palavras com o Pedro e com o Nuno. Que talvez estivesse a andar rápido, mas agora era seguir e aproveitar enquanto o sol ainda não descobria. Até aqui não tinha provado sequer uma migalha de calor perturbador.

Aproveitei para me barrar com protetor solar, era meio-dia e mais hora menos hora ele aí estaria. Saí do Canal Caveira pelas 11h58m, com cerca de 2 horas de avanço face ao plano e estimativa iniciais, o que era bom, pois dava margem para o trajeto seguinte, que para além do calor, tinha um percurso de sobe e desce em extensão a té Beja, ondulado, sem grandes inclinações mas com comprimento bastante.

Despedi-me do pessoal do restaurante que me desejou boa viagem, pois havia chamado a atenção com capacete, luvas e colete, e comentámos as incidências até ali e dali para a frente. Encorajaram-me dizendo que era sempre a descer até Vila Real de Santo António J, mas que fosse depressa pois o sol ainda ia aparecer certamente, era raro o dia estar fresco aquela hora. Agradeci e arranquei, rumo a Beja. Estômago cheio, protegido do sol, com as pernas descansadas, chegara a hora de começar a gerir uma das variáveis mais perigosas e que poderia motivar a passagem ao plano B, encostar pelo caminho em alguma localidade ou no limite em Beja, caso aquecesse demais.

Com 107km percorridos as pernas estavam excelentes e a motivação em alta. O efeito do vento não se fazia sentir, mas estava lá bem gravado no relógio e na margem que ia acumulando. Não sabia, mas estava passada uma fase importante, mentalmente, a da superação das pequenas dores iniciais de alerta das pernas e do traseiro, e a da inércia que se instala quando se percorrem troços muito longos sem as devidas paragens.


Em termos estratégicos, as paragens de hora e meia em hora e meia, rápidas, tipo dez minutos para hidratar e petiscar, junto com as paragens maiores de meia hora a cada cinquenta ou sessenta quilómetros, revelar-se-iam perfeitas.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

Etapa 1: Cassa - Cais do Sodré - Cacilhas - Setúbal/Troia

Casa - Cais do Sodré = 12 km
Cacilhas – Setúbal / Troia = 39,7 km

Total Etapa 1 = 51,7 km

À boa maneira das corridas, a semana foi de descanso. Assim como a anterior. Duas sessões de treino leves e na semana da aventura apenas uma saída até ao cais do Sodré e volta, quarta feira de manhã, para reconhecer o percurso na saída.
O último treino longo havia acontecido dois fins de semana antes, com um acumulado de 190 quilómetros, entre sábado de manhã (90 minutos de intensas subidas na zona de Barcarena); sábado à noite (100 km com a subida noturna à malveira da serra) e domingo de manhã com 60 quilómetros a rolar, junto com o nuno e com direito a um travesseiro na pastelaria Garrett no Estoril, para avivar as memorias de nadador adolescente).

A lista estava verificada:
  • Powerade – três garrafas
  • Uma camisola de manga comprida, duas de manga curta
  • Pilhas para a luz traseira e para a dianteira
  • Luz pequena para a frente, suplente
  • Bomba
  • Colete refletor, capacete e luvas
  • Banda refletora para o tornozelo
  • Dinheiro – cerca de 30 euros para travessias de barco, almoço e compra de líquidos e snacks
  • 3 sandes de queijo com doce de tomate
  • Duas camaras de ar suplentes
  • Documento de identificação
  • Pano com pescoço comprido para proteger a cabeça do sol
  • Plano do trajeto em papel, com os quilómetros totais e parciais (ver o post de início de julho)
  • Protetor solar (falhou, esta foi a compra na zona da comporta quando o sol estava a ameaçar romper)
  • Creme barral, logo de manhã uma passagem bem cheia nas partes sensíveis
  • Umas meias e umas cuecas suplentes
  • Caneta

Tudo pronto e arrumado, essencialmente na mochila (não utilizo, por enquanto, armação para suporte de malas), a saída aconteceu exatamente às 5h45m. Tudo a postos, uma sandes permitiu começar a ingestão ao longo do dia. O segredo das longas saídas de bicicleta, para além do treino continuado e da acumulação de quilómetros, reside essencialmente na gestão dos ritmos e dos descansos e na ingestão contínua de calorias e líquidos para repor o que se vai perdendo.
Como era de noite optei (bem) pela camisola de manga comprida. Junto ao rio, no museu da eletricidade o mote: “ a noite é boa conselheira”, a letras vermelhas bem iluminadas. Concordo. Boa conselheira quando nos sabemos integrar bem nela. Sem carros e sem grande agitação (algures em Alcântara Mar alguns sons vinham do Hawai), algo pouco comum há uns anos naquela zona e numa madrugada de sexta-feira.

Primeira paragem, no terminal fluviário do Cais do Sodré, na hora prevista 6h15m. Alguns jovens que regressavam à margem sul vindos da noite lisboeta produziam um pouco de ruído, sem incomodar. Cinco minutos de espera e eis que surge o barco, de onde começam a sair os trabalhadores madrugadores, o povo da margem sul que se dirigia aos seus locais de trabalho. Gente que para estar às 6h20m no cais do Sodré havia certamente acordado bastante mais cedo, gente com feições marcadas pelos dias longos e pelo tempo para pensar na vida nos trajetos madrugadores onde poucas pessoas ainda povoam os barcos.

No barco que partiu à hora prevista, 6h23m, com muito poucos companheiros de viagem, uma olhada à mochila, fiz a mudança de camisola para modo manga curta e a preparação mental para um dia longo. Lisboa ficava para trás, as colinas e os telhados que se vislumbravam por entre uma ténue neblina, o rio a ditar as regras com um ligeiro ondular. Na porta da casa de banho, fechada, uma mensagem do género “caso deseje utilizar, contacte o marinheiro de serviço”. Afinal existem marinheiros que também dão suporte às pequenas travessias, quando geralmente penso em marinheiro integrado em grandes navios.

Chegado a Cacilhas pelas 6h38m, vinte e dois minutos antes da hora de saída prevista, era altura de pedalar. Motivado fiz-me à estrada. Uma ciclovia relativamente bem conservada permitia ir, aquela hora, ao lado dos carros e em bom andamento. Os estaleiros da Lisnave, imponentes, senhores de tantas empreitadas, lutas e aventuras davam o mote para um dia em grande. Mais à frente as primeiras camionetas saiam para o início do dia de transporte de muitas vidas.
Rapidamente cheguei à Cova da Piedade, terra familiar da infância e adolescência, ou não fosse a Sociedade Filarmónica União Artística Piedense um dos locais e coletividades onde se realizavam inúmeras provas de natação na piscina então descoberta. Relembrei com saudade as várias vezes em que participávamos nas 24 horas a nadar, noite e madrugada adentro, sempre bem tratados pela família Freitas e pelo coletivo da SFUAP e os episódios de estreia na visualização de filmes para adultos, na companhia dos colegas de equipa, nas sessões da meia noite, quando a idade era ajustada aos requisitos de entrada, julgando nós, jovens imberbes que enganávamos alguém.

Mais à frente e na pequena inclinação da estrada tempo para apreciar a confusão urbanística à qual o metro de superfície terá dado alguma harmonia (minha opinião que não percebo nada disto, nem da zona naturalmente). Deparei-me com algo que nunca tinha visto, um edifício onde em grandes letras está inscrito “Igreja Mundial do Poder de Deus”. No meio de tantas igrejas, esta era uma novidade. Do outro lado da rua a funerária Cruz, uma das pequenas, certamente a lutar contra os impérios multinacionais, e a captar clientes, quem sabe, para quem a ajuda do lado contrário da estrada não terá sido suficiente.

Seguindo caminho, em bom andamento, uma série de descidas permitiam ganhar algum tempo ao plano. O vento de costas ajudava. Rapidamente cheguei à estrada para Setúbal, após a Cruz de Pau, e entrei na estrada para Brejos de Azeitão. Pelo caminho e um pouco desorganizados na memória apareceram-me a cínica do Dr. Nashimura, orientada de acordo com a placa exterior, para a coluna vertebral J, a fábrica das tortas de Azeitão que para meu desgosto se encontrava fechada à hora que passei, as instalações, muito degradadas da Associação Empresarial da Região de Setúbal, a fábrica da “Bacalhoeira” de onde  emanava uma brisa a belos vinhos e a rodoviária do Alentejo, também com uma considerável degradação exterior. Logo a seguir uma pequena subida e eis que surge o caminho já numa das encostas da Arrábida, rumo a Setúbal.

Sem conta quilómetros, que havia finado uns dias antes, ia vendo o tempo e percebendo que estava algo adiantado. Com duas ou três descidas retemperadoras, Setúbal estava à vista e quando olhei para o relógio percebi que havia ganho bastante tempo. A hora prevista de saída de Setúbal era as 9h30m, e pelas 8h31m tinha passado a Avenida Luísa Todi e estava a comprar bilhete para o ferry, rumo a Troia. Um pouco antes, sem ter noção do horário dos barcos decidira não entrar num supermercado para comprar protetor solar, o que e revelou uma boa decisão, pois permitiu-me apanhar o ferry das 8h40m, quase sem interrupção nem tempo de espera.
O tempo estava fresco, o sol escondido, o clima ideal para a longa distância, a motivação em alta.
Aproveitei o Sado e a travessia para alongar e comer, bem como fechar a primeira das garrafas de powerade. Na margem oposta Troia ia estando mais próxima.
Um rapaz com sotaque nortenho, também de bicicleta perguntou-me se me dirigia para Sines; queria companhia. Respondi-lhe que não e desejei boa viagem, ele que ia bastante mais pesado do que eu, com saco cama e um saco de viagem. Já em Troia, a saída e a segunda etapa a começar.
Entretanto havia recebido mensagem do Pedro a dar força e a acertar na previsão de que estaria por terras de Setúbal. Ponto de situação também ao Nuno e lá segui viagem.


Percorrer estas longas distâncias também se deve caracterizar pela estratégia de decomposição do todo. Partindo muitos quilómetros em bocados uniformes ajuda mentalmente a focar em vários objetivos, que se vão desenrolando para um objetivo maior e permite marcar pontos de controlo para avaliar o progresso e recuperar forças.

quinta-feira, 31 de julho de 2014

Brevet Pessoal Guadiana 300 - 306 km a pedalar

É difícil exprimir a felicidade na descida e no trajeto final, habitualmente realizado de automóvel.
Foi o culminar de uma ideia nascida uns meses antes, de um processo de muita aprendizagem, de um plano de viagem com limites bem definidos, de um dia de férias antecipado e preparado para um retiro pessoal, um dia de reflexão em movimento em cima de uma bicicleta, um dia de aventura por entre novos cheiros, pessoas e vistas.

Dezoito horas e nove minutos antes saía de Miraflores rumo ao sotavento Algarvio. Cais do Sodré, Cacilhas, Setúbal, Troia, Grândola/Canal Caveira, beja, Mértola, Vila Real de Santo António e a terra dos banhos, eram simultaneamente os destinos e os postos de controlo e avaliação. Foram trezentos e seis quilómetros de puro espírito de viajante, sozinho à descoberta, de lugares mas, sobretudo, dos limites e de mim próprio.

Há precisamente um ano, também em férias, no final de julho, havia passado uma semana dura, com um episódio de hérnia discal, uma das duas que cá estão, bem presentes. As atividades de férias, a canoagem com a criançada ou sozinho na ria formosa, as brincadeiras na praia, não são o melhor seguro para manter a saúde da coluna, quando já não está 100%.
Sem conseguir, nem querer correr (algo que desde 2012 percebi que me fazia mal e era incapacitante para a vida quotidiana) e tendo tomado a decisão de abandonar essa paixão da corrida (algo de que falarei num próximo post), dado o prejuízo que me trazia, impus-me agarrar a qualquer outra forma de movimento e de exercício.
Caminhar seria sempre a base, mas precisava de mais. Nadar é algo esporádico por estes dias, de vez em quando vou à piscina com um dos meus filhos, mas não tem tido a frequência que teve noutros tempos.

Num primeiro momento e ainda em férias em 2013, utilizei a bicicleta como forma terapêutica, pois, ao contrário do que poderia ser expectável e do que todas as pessoas à volta me diziam e/ou recomendavam em sentido contrário, pedalar não agravava a dor; pelo contrário, foi-me ajudando a manter a atividade, a alongar bastante bem depois de cada passeio e a ganhar confiança.

E continuei, sempre, entusiasmado, como quando em criança descobri a bicicleta e a liberdade que permitia.

Desde há três anos que tento participar, com pouca disponibilidade,  diga-se, na dinamização de uma organização chamada “Randonneurs Portugal” que promove eventos de “pedalar para longe”, com regras internacionalmente definidas e cujas iniciativas são designadas de brevet randonners mondiaux, os BRM.
Os BRM são eventos de 200, 300, 400, 600, 1000 ou 1200 quilómetros, em autonomia, onde os Randonneurs participantes podem auxiliar-se, mas sem apoio externo.

E assim, após as três primeiras semanas de recuperação do forte episódio que referi acima, em que não mais tive problemas (desde essa altura nunca mais tive qualquer reincidência), continuei a pedalar, entusiasmado e a aprender uma nova forma de movimento.
Estabilizei nas três ou quatro sessões semanais (um dia geralmente à noite durante a semana; quando posso, dois) e as manhãs bem cedo de sábado e domingo, como quando corria.
Desejava fazer um primeiro BRM de 200km em outubro do ano passado, mas não foi possível por coincidir com a festa de aniversário da Rita.
Continuando sempre a pedalar comecei o ano de 2014 com uma primeira aventura de 100 km, para ver como me sentia. Perto de casa, entre a Expo e a boca do inferno em Cascais, fiz um circuito nessa distância e consegui. Decidi aí fazer um BRM de 200 km em janeiro, e depois deste, um outro em fevereiro (a seu tempo cá estarei com a descrição destas duas aventuras).
A partir daí não tinha mais objetivos a não ser pedalar por prazer e continuar a aprender em cima da bicicleta, desfrutando dos passeios, sozinho ou com os meus Amigos domingueiros. A minha GIANT, que me custou 100 contos em 1991, na altura 2 ordenados de professor de natação, e que pesa 14 kg, é um misto de BTT com urbana e não deixava, pensava eu, margem para grandes aventuras para além dos 200km.

Mas … e o início desta aventura rumo ao Sotavento, como qualquer outra, tem sempre um mas ou um “era uma vez”, …, no final do primeiro BRM de 200k um Randonneur chamado Rui Rodrigues contrariou a minha versão de que 300 km só com uma bicicleta de estrada. Referia na altura o Rui que, “porque não …”, apenas com uns retoques, era perfeitamente fazível.
Ficou-me na memória. E há cerca de 3 meses decidi que tiraria um dia de férias só para mim, para vir de bicicleta para junto da família no sotavento algarvio.

Havia que escolher o percurso de acordo com os requisitos: fazer uma etapa única, tendo como referência o tempo de 20 horas, o limite para concluir oficialmente um BRM 300km. Ouvidas várias opiniões optei pelo percurso menos longo, que me foi sugerido pelo Pedro, e que perfez 306 km desde a saída de casa até à chegada.

O dia chegou, tudo correu muito bem, foi um processo de grande intensidade, de grande aprendizagem, de grande felicidade e realização. Foi planeado ao pormenor (algum pormenor apenas, …), tive bastante sorte com o tempo (vento de noroeste e o calor a dar algumas tréguas – máxima de 34 graus entre Beja e Mértola), mas foi sobretudo o resultado de um trabalho continuado e bem realizado de treino e preparação em qualidade, com alguma quantidade – realizei nestas últimas semanas três treinos de 100 km, uma com bastante desnível – a preparar a serra do parque natural da reserva do Guadiana e Mértola; outra noturna – a preparar o final; outra no pico do calor – para preparar Beja e Mértola. Foi essencialmente o resultado da continuidade e da acumulação de passeios – no espaço de 1 ano já pedalei mais de 6.500 km e essa é a principal razão para ter conseguido fazer estes 300km numa única etapa, duas horas mais rápido do que havia planeado e com as pernas e o rabo em boas condições.

Descreverei aqui cada uma das etapas com os seus detalhes, delícias e pormenores.
Para já, está feito, valeu, não apenas, ou não exclusivamente pela felicidade no final, que como qualquer momento de felicidade, se esvai rapidamente, mas por todo o caminho, pela aventura, pelas histórias para contar, pelas perspetivas futuras.

Um agradecimento, desde já, a todos os que me ajudaram nesta aventura.
Para já à malta cá de casa, porque sem qualquer receio sabiam que ia conseguir e também têm a paciência para aturar as saídas por vezes mais longas.
Ao Pedro e à Filomena pelo bicho que tomou conta de mim, e ao Pedro em particular pelo mentoring e ensinamentos permanentes e pelo espírito – o espírito que interessa.
Ao Nuno e Carlos pelo incentivo e pelos passeios de domingo. Ao Pedro BD por todo o ensinamento, partilha e afinação da bicicleta. Ao Paulo M. pelo vaticínio de que a seguir aos 200k começaria logo a pensar nos 300 km J.
À malta Amiga que foi desejando boa sorte.
Aos vários Randonneurs com que me tenho cruzado, pelo exemplo e partilha.
Naturalmente ao Rui, que sem saber, foi uma alavanca para esta aventura.
E ao longo do dia do longo passeio, um obrigado ao Pedro, Nuno e Luís, por toda a força, partilha e ouvidos.

Mais aventuras estão à espera, mas para já é continuar a pedalar e passar por aqui para contas em 6 etapas as peripécias deste dia.